Como dispensar um paciente complicado - seja no SUS ou no sistema privado?

8 de novembro de 2024
Renata Barbosa

Se você é médico, precisa conhecer as melhores estratégias para encerrar o vínculo com um paciente difícil de lidar, sem expor sua carreira a riscos.

Entre um atendimento e outro, ele entra no seu consultório: o paciente complicado. Mas, quem é ele, afinal?

O paciente complicado é aquele que apresenta queixas exageradas demais, que questiona maliciosamente tudo o que você diz ainda que você explique várias e várias vezes, que tumultua a recepção querendo uma prioridade que não lhe é de direito, que se recusa a aderir ao tratamento porque prefere aquela outra conduta que viu na internet, que é agressivo ou desrespeitoso, que cobra que você peça mais exames do que é necessário, ou que não confia em você porque o sobrinho do amigo dele (que também é médico) pensa diferente.

São tantas as faces…

“Lidar com gente é complicado”, diz a sabedoria dos mais velhos. As relações humanas apresentam formatos múltiplos e complexos e, por tal razão, conflitos não são incomuns. A relação médico-paciente apresenta nuances ainda mais delicadas, considerando que até mesmo os mais simples abalos na saúde do indivíduo podem causar repercussões emocionais que trazem uma camada extra de desafio a esse tipo de interação humana.

É fácil perceber que dores, medos e angústias colocam o paciente em condição de vulnerabilidade. Porém, é necessário também considerar que o comportamento ou personalidade de alguns pacientes podem vir a colocar o próprio médico em posição vulnerável, considerando que essa relação exige confiança e colaboração.

Como o médico pode se desvincular de um paciente difícil de lidar na prática?

O Código de Ética Médica oferece apoio ao médico, estabelecendo como princípio fundamental o exercício da profissão com autonomia, sem que o médico seja obrigado a atender a quem não deseje. 

Quais são os casos nos quais o médico é obrigado a prestar atendimento?

As ressalvas são intuitivas: apenas se o paciente estiver em situação de urgência e emergência e não houver outro médico para realizar o atendimento, ou se a recusa puder causar danos à saúde do paciente, é que o médico é obrigado a realizar o atendimento.

Mesmo nos atendimentos realizados através do Sistema Único de Saúde, isto é, no âmbito público, o médico pode se negar a realizar o atendimento de determinado paciente, desde que obedeça aos requisitos listados acima.

Os cuidados com a anotação da recusa em prontuário médico

A recusa desse atendimento precisa ser adequadamente registrada no prontuário e até mesmo no livro de ocorrências do hospital, conforme o caso, indicando quais são as razões que levam o médico a se abster, e, se possível, com a indicação e referendo de outros profissionais que testemunharam acerca da não condição de urgência e emergência do paciente em questão, e/ou da existência de outro médico para o atendimento.

Também no âmbito privado é possível se deparar com a desagradável figura do paciente complicado e, mais uma vez, o médico pode precisar dispensar esse atendimento. Nesses casos, é necessário outra dose de cautela, tendo em vista que – por se tratar do próprio nome do médico ou da clínica – a chance de exposição midiática pode oferecer maiores riscos.

Do mesmo modo que no setor público, o médico precisa registrar de forma completa e adequada os motivos pelos quais deseja dispensar o paciente. Com a correta orientação jurídica, o médico deve estabelecer um diálogo neutro com o paciente em questão e, principalmente, solicitar que ele assine um documento capaz de formalizar o fim daquela relação.

É interessante que nesse termo, elaborado com embasamento jurídico e com a abordagem mais prudente, estejam especificadas quais são as orientações médicas dali em diante, como a busca por outro profissional e a manutenção ou não de determinadas medicações. 

Para além disso, o médico deve entregar ao paciente um relatório completo do seu quadro clínico para que ele possa apresentar esse documento ao novo profissional que procederá ao seu atendimento.

Desde que a decisão de recusar o atendimento de um paciente esteja livre de preconceitos, você, médico, possui autonomia para deixar de atender pacientes que te afastam da atuação médica que você almeja. Com uma orientação jurídica competente, você está a caminho de experimentar uma medicina mais tranquila.

Lembre-se de que a orientação de um advogado especialista na elaboração e no preenchimento de documentos médicos é essencial para evitar problemas no futuro.

Autor:

Renata Barbosa

Renata Barbosa (Instagram: direitomedicocomrenata), advogada especializada em Direito Médico, inscrita nos quadros da OAB/BA sob o nº 60.982, atuante em todo o território nacional, com formação em Direito pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, pós-graduada em Relações Sociais e Novos Direitos pela mesma universidade, pós-graduada em Direito Médico pela Escola Brasileira de Direito e aprendiz no Treinamento Avançado em Direito Médico da Samantha Takahashi desde 2022.

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