Como hospital e médico devem proceder quando o paciente foge sem a devida alta?

18 de julho de 2024
Ana Paula Alves

Medidas preventivas quanto a possibilidade de eventuais responsabilizações (civis, penais, administrativas e éticas) tanto da unidade hospitalar quanto do médico responsável pela internação do paciente.

A fuga de um paciente da unidade hospitalar precisa ser avaliada com cautela pelos gestores e toda a equipe de profissionais que a compõe. Este ato do paciente acaba por desencadear consequências como a responsabilização civil, criminal, ética e administrativa.

O paciente tem direito de sair do hospital mesmo sem ter alta? 

O paciente em fuga geralmente é aquele que já fez a tentativa da alta a pedido, a qual ocorre quando o paciente ou seus acompanhantes pedem ao médico, independentemente  do seu estado clínico, para que lhe seja conferida a alta. Quando não autorizada pelo médico, geralmente empreendem fuga do hospital.

É de ser levado em consideração que o paciente possui seus direitos de ir e vir garantidos pelo artigo 5º, II, da Constituição Federal, impossibilitando assim a manutenção do seu cárcere no nosocômio. O paciente tem direito a decidir, de forma autônoma, sobre seu estado de saúde e também recusar a terapêutica proposta. 

Ocorre que, existem limites sobre tais decisões e que precisam ser ponderados. Quanto à limitação das vontades do paciente, em primeiro momento torna-se necessário que o médico e os demais profissionais realizem um trabalho de informação e conscientização das possíveis intercorrências acerca da alta prematura, conforme o estado de saúde do paciente. 

Imperioso referir que o paciente possui autonomia garantida tanto no Código de Ética Médica quanto nos Princípios de Bioética.

Mas o que fazer se mesmo assim ocorra a evasão do paciente? Quais as atitudes que devem ser tomadas pelo gestor hospitalar e o médico?

Uma das primeiras atitudes a ser tomada é comunicar imediatamente o fato ao diretor clínico do estabelecimento, e na ausência deste, ao responsável hierárquico. Em seguida, registrar o fato no prontuário do paciente, especialmente das condições clínicas imediatamente anteriores à fuga, discorrendo sobre as possíveis consequências clínicas da evasão do paciente. Posteriormente, comunicar o responsável legal ou familiares acerca do fato e diligenciar na busca para que regresse.

De primeiro momento não se orienta o registro em órgão policial, a fim de evitar

futuras investigações e assunção de responsabilização.

No entanto, há possibilidade de responsabilização da unidade hospitalar e também investigação da conduta médica por ação ou omissão, podendo gerar responsabilização civil (danos acaso ocorram), penal (morte em decorrência do agravamento da doença a que estava sendo tratado), administrativo e ético (junto ao órgão de classe responsável).

Fazendo uma análise apenas da hipótese que o paciente venha a óbito e que fique comprovado o nexo de causalidade entre a fuga, o agravamento da doença e o resultado morte, há duas situações bem claras que são discutidas nos Tribunais hodiernamente: - configuração de falha na prestação do serviço da unidade hospitalar e falha na prestação da vigilância (atos paramédicos e extramédicos), gerando dever de indenizar (TJRS, Ap. Cív., nº 70074798331, 10ª Câmara Cível, rel. Des. Catarina Rita Krieger Martins, j. 28/09/2017) - isenção da responsabilização hospitalar diante da fuga, não havendo que se falar em falha na prestação do serviço quando se trata de paciente mentalmente sadio, visto ser um ato voluntário e exclusivo realizado pelo paciente. A exceção a tal interpretação é se o paciente possui distúrbios psíquicos ou se for menor de idade (TJPR, Ap. Cív. n 1583436-7, 10ª Câmara Cível, rel. Des. Carlos Henrique Licheski Klein, j. 02/02/2017).

Se o médico possui contrato de trabalho com o hospital, caso haja responsabilização deste, quem responde pelos danos, em primeiro momento, é a instituição de saúde, de forma objetiva. 

Posteriormente, poderá, provada a culpa do profissional médico (imprudência, negligência ou imperícia), ingressar judicialmente lhe cobrando os danos a que teve que suportar, através de ação regressiva.

Por fim, é de fundamental importância atentar-se para o diálogo com o paciente quanto ao seu direito de escolha, mas também acerca da necessidade de tratamento adequado, evitando futuras complicações clínicas em decorrência da alta prematura. 

No entanto, quando há fuga da unidade hospitalar sem o consentimento do médico, algumas medidas precisam ser tomadas de forma imediata, conforme já mencionado, como: comunicar o diretor técnico ou o responsável hierárquico, registrar o fato no prontuário do paciente com as devidas informações acerca do quadro clínico e as possíveis consequências da fuga. Comunicar o responsável legal ou familiares. Diligenciar na busca para o paciente regressar.

Com a realização de todos estes procedimentos preventivos busca-se amenizar uma futura responsabilização caso o pior aconteça com o paciente e este venha a óbito em decorrência da doença a que estava sendo tratado na unidade hospitalar.

Diante do que foi mencionado, a sugestão é buscar sempre orientação com um profissional especializado em Direito Médico para uma análise específica de cada situação, de modo a poder indicar a melhor solução possível.

Autor:

Ana Paula Alves

Graduada em Direito pela Universidade Regional Integrada e das Missões- URI, Campus de Frederico Westphalen/RS em agosto de 2012. Pós-graduada em Direito Público pela Escola do Ministério Público do Rio Grande do Sul Pós-graduada em Direito Médico e da Saúde pela Damásio Educacional Membro da Comissão Especial de Direito à Saúde da OAB/RS Membro da Comunidade de Direito Médico do IEST (Instituto de Ensino Samantha Takahashi) Escritório Profissional em Rodeio Bonito/RS Atuação em: Direito Médico, Direito Odontológico e demandas relacionadas à saúde (medicamentos de alto custo, tratamentos, cirurgias, demandas contra o SUS e Planos de Saúde). Instagram: advanapaula_dirsaude

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